logo da Torre Tecnocrata

Unidos pela Ascensão

[Um Conto de Mago: A Ascensão, escrito por  Mauricio Canavarro]

Importante: Para o entendimento pleno deste conto é necessário que se tenha lido o Prelúdio do conceito de personagem Mago Criança disponível aqui.

1

   O helicóptero sobrevoava o parque de diversões. Dentro além do piloto estavam Gibson Troollskkin, o Hit Mark familiar de Cristiano, e a senhora Beatriz Carvalho. Senhora era provavelmente um termo exagerado para se referir àquela mulher, pois embora fosse casada ainda possuía um corpo exuberante e traços de uma ninfa de vinte poucos anos.
helicóptero

   Cristiano planejara aquilo tudo. Através do vínculo empático com seu “pai adotivo” ele passaria as instruções de como Gibson deveria agir para ser bem-sucedido em uma reunião com uma de suas parceiras de negócio mais importantes. O próprio helicóptero havia sido magicamente modificado por Cris para que o seu ruído fosse inaudível em seu interior, embora a senhora Carvalho não parecesse muito impressionada. Enquanto Gibson tentava passar um clima descontraído e uma atitude extrovertida, a senhora Carvalho parecia fria e formal.

   – Por favor, esqueça as formalidades, façamos deste passeio um momento divertido. Me chame apenas de Gibson – dizia o Hit Mark.

   – Certo, Gibson. – respondia Beatriz vencida. – O passeio está maravilhoso, mas eu gostaria de rever alguns dos termos de sua proposta, já que nós da Arquibeb temos plenas condições de fornecer todas as bebidas para o parque com exclusividade.

Beatriz, no entanto fizera tal afirmação por pura atuação e vontade de proteger um engodo, já que secretamente controlava os demais concorrentes. Os refrigerantes e sucos que seriam vendidos no parque estariam cheios de nanomecs, uma nanotecnologia da Tecnocracia que permitiria monitorar e influenciar a saúde de seu proletariado, quer fossem fornecidos pela Arquibeb ou pela Erg Cola.

   – Sabe que eu não posso abrir mão desses termos, Beatriz. Nós também firmamos compromissos com outros fornecedores e os acionistas prezam por um ambiente de maior concorrência. – disse Gibson.

A resposta automática era previsível, porém uma análise dele não lhe permitia deduzir se ela estava sendo ingênua. Cris acreditou levar a melhor.

2

   Horas depois Beatriz estava de volta ao Constructo dos Progenitores. Enquanto caminhava pela plataforma em meio aos tanques de bacta ela se aproximava de seu espelho, sua cópia, sua irmã gêmea. Luana encarou Beatriz e comunicou:
Tanque de bacta exemplo
Exemplo de tanque de bacta

   – Não se preocupe com nada disso. Gibson sempre esteve conosco desde o início. Anos atrás eu enviei um Victor* da Erg Cola para acabar com a família de Cristiano Troollskkin e Gibson completou a encenação de maneira magistral; agora somos parte indireta da família dele. Aquela criança é poderosa, mesmo para um transgressor de apenas onze anos. Tivemos que fazer assim, pois nossos destinos estão conectados desde outra era. 


*: Victors são uma espécie de “golems modernos” dos Progenitores da mesma forma que os Hit Marks são uma espécie de “golems modernos” da Iteração X. São constructos feitos de biotecnologia progenitora. 

3

   A máquina humanoide subia a montanha gelada. A nevasca não fora suficientemente forte para superar a obstinação de Jester que se aproxima do antigo monastério. Quando a máquina chegou aos portões esta se congelou por completo, ao passo que concomitantemente as portas do lugar se abriram sozinhas.

   Jester pulou para fora da máquina e adentrou o salão do monastério. As portas atrás se fecharam em seguida. Um estranho calor inundou o cenário. O goblin, Jester, podia ver no fundo do salão um antigo trono onde aparentemente descansava uma velha em roupas esfarrapadas. Quando Jester se aproximou ele escutou:

   – Ridículo. Mas que coisa mais clichê! Você ainda por cima acreditou que encontraria um homem. Hahahaha. Você tem mesmo uma imaginação muito preguiçosa. – disse a voz na cabeça do goblin.

   Jester se perguntou se fora a velha quem falava, mas ela permanecia imóvel.

   – Estou aqui! Não aí. Aqui embaixo! Em cima a mão.

   Jester olhou para a mão da velha e viu que ali descansava uma mosca.

   – Um ser tão pequeno a lhe ensinar? Não seu bobo. É você quem se imagina maior do que eu e durante muito tempo eu cometi o mesmo erro. Achei que você fosse minúsculo. Mas você finalmente deu atenção a mim. – disse a voz.

   – Não permita que o corpo da mosca o cegue, Jester. Nós somos muitos, mas para você se conectar a nós você precisa se conectar ao mundo a sua volta. Estamos por toda parte.

Desta vez a voz vinha de dentro para fora e embora tivesse um timbre semelhante à anterior, também tinha uma ressonância semelhante ao de seu avatar.

   – Se conectar até mesmo com a Ordem da Razão? – indagou Jester.

  – Até mesmo com a Ordem da Razão; no fundo eles não diferem muito das Tradições Místikas. Você precisa transcender suas ideias, suas motivações e suas realizações – respondeu a voz.

Agora Jester estava desconfiado, pois diversas vezes seu avatar utilizava o método da enganação como uma forma de aprendizado. A voz continuou:

 – Quando veio para cá você se ateve ainda a questão do tamanho. Tanto o ser humano quanto os demais seres não deixam de crescer quando atingem determinadas dimensões como altura, largura e profundidade. Qualquer um percebe que o termo “adulto” é na verdade um engodo, contudo também é verdade que apenas expandindo a imaginação você somente ganhará aquilo que alguns chamam de “massa” para a sua mente.

 – Então temos que transcender a imaginação? – pensou alto, Jester.

 – Sim, sobretudo as imagens, símbolos que permitem nos comunicar uns com os outros.

 Jester agora compreendia porque sua mente estava uma bagunça e sua habilidade de “projetar” confusa. Seu avatar estava muito ocupado com outra meta e havia entregue suas projeções ao caos em uma tentativa de obter pistas do próximo passo para a ascensão. Agora ele compreendia que nenhum Oráculo lhe daria a resposta de bandeja. 

4

 Beatriz dormia debaixo d’água quando deixou seu rosto emergir da “piscina” em forma de casulo de seu laboratório. Quando seus olhos abriram ela viu Luana de pé na plataforma lateral observando-a.

 – Essa memória é do passado? Anterior à formação da Tecnocracia? – perguntou Beatriz.

 – Não sabemos. Na verdade, eu mesma acredito que pertence ao futuro. Quando nossos fundadores deixaram a Terra para trás em direção ao espaço profundo creio que eles ainda usavam o antigo nome dos tempos de propagação do iluminismo. Certamente a mente deles é diferente daqueles que nos comandam por aqui. – respondeu Luana.

Separados pelos métodos e paradigmas, mas unidos por um mesmo propósito. Aqueles magos ainda sonhariam muito antes de mudar a realidade.

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem